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Até quando usuários de transporte público morrerão por omissão das autoridades?

A simpatia constante do condutor Nelson. Foto de Ana Redig

Faz tempo que o mandato, a AMAST (Associação de Moradores e Amigos de Santa Teresa) e usuários reclamam da falta de manutenção adequada nos bondes de Santa Teresa. Mas nossas denúncias não tem ressonância. O acidente que matou, até agora, cinco pessoas e feriu 57 passageiros é uma tragédia anunciada, sim. Há mais de um ano, publiquei no site relatório do CREA/RJ indicando que as novas composições deveriam sair de circulação. O laudo técnico da Comissão de Avaliação e Prevenção de Acidentes do órgão também foi ignorado. Bondes novos e velhos continuaram circulando como que à espera de uma fatalidade. Fatalidade?

Em 2008, o mandato ajudou a AMAST a redigir ação cívil pública contra a Companhia Estadual de Engenharia de Transportes e Logística (Central), impetrada através do Ministério Público. Subordinada à secretaria estadual de Transportes, é a Central que opera os bondinhos. A ação foi movida porque havia falhas no projeto de modernização, principalmente em relação à segurança. O estado foi condenado, pelo Tribunal de Justiça, a reformar estações, substituir 4.600 metros de fios de contato, recuperar 8Km de via, reformar 14 bondes e a oficina de bondes, substituir o gradil sobre os Arcos da Lapa, construir abrigos de bondes, implantar seis seccionamentos na rede aérea, recuperar 60% dos trilhos e pavimentos – em mal estado de conservação – da via permanente, não contemplados pelo “Projeto de Recuperação do Sistema de Bondes de Santa Teresa” e pagar indenização por danos ambientais, em valor não inferior a R$ 100 mil. O estado, claro, recorreu ao Superior Tribunal de Justiça e o processo até hoje não foi concluído.

Dói pensar nas mortes injustas. Dói pensar em como o condutor Nelson Correia da Silva, apelidado pelos passageiros de tartaruga por sempre dirigir o bonde com cautela, não abandonou o barco e sacrificou sua vida apelando para que as pessoas pulassem do bondinho antes da inevitável colisão. Bastava uma volta no bonde para se notar o orgulho e o prazer dos condutores em guiar moradores – adeptos do transporte barato e agradável – e muitos turistas brasileiros e estrangeiros, para quem o passeio pelas ruas de Santa Teresa é obrigatório.

A sociedade assiste a mais uma mostra de falta de compromisso ético e político e de ausência total de sensibilidade social das autoridades. Esse sentimento falece entre nossos governantes. E não dá para aceitar mais uma tentativa de jogar a culpa sobre as costas de um condutor respeitado e querido por moradores e usuários, Nem tentar transformar em algozes os próprios passageiros que não foram impedidos de superlotar o bonde. A quem cabe fiscalizar, cobrar e manter a eficiência deste serviço de transporte?

Usuário contumaz e residente, Diógenes Ribeiro participou da manifestação de moradores realizada ontem no bairro. Ele não tem dúvidas que a causa do acidente foi falta de manutenção. Nós também não. Nem o CREA. Técnicos do conselho constataram, em verificação preliminar, que, ao invés de parafuso, um arame prendia a caixa de óleo do eixo da roda do bonde. Isso é apenas a ponta de um iceberg.

Circulando desde 1896, os bondes pararam por tempo indeterminado, por ordem do secretário estadual de Transportes Júlio Lopes. E agora? A comunidade protesta pelos mortes, protesta contra a negligência na manutenção e fiscalização e também protesta pela paralisação do transporte que é a alma do bairro. O bonde não pode parar!

A AMAST faz uma manifestação na próxima quinta-feira pelos 115 anos do bonde de Santa no Largo da Carioca. O ato já estava programado antes do acidente e a intenção era justamente reclamar do funcionamento do bondinho. O serviço, como todos sabem, é precário há anos. São tão poucos bondes em circulação que mais parece uma estratégia do estado com a finalidade de asfixiar este meio de transporte – que só sobreviveu em Santa Teresa – até sua paralisação total. Há quem veja nisso uma clara sabotagem cujo objetivo final seria privatizar o bonde e cobrar tarifa cara, com preço para turista. Hoje, o bilhete custa apenas R$ 0,60.

Queremos o bonde de volta, sim! Mas queremos o bonde com segurança! E isso, Sr. secretário, é possível!

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