Peu das Vargens

A arquiteta Andréa Albuquerque Garcia Redondo enviou o comentário abaixo para o blog. Vai ao encontro do pensamento do mandato, por isso publico como post para permitir ampla leitura.

“Com o sugestivo e corajoso título “Sob Suspeita” o Editorial do jornal O Globo do último dia 7 alerta para a aprovação – pelos vereadores do Rio e sem prévia discussão com a sociedade – de projeto de lei que mudará as regras urbanísticas dos bairros Vargem Grande, Vargem Pequena, Camorim, e parte de Jacarepaguá, Barra da Tijuca e Recreio dos Bandeirantes. A lei proposta é extensa e complexa: 113 artigos, vários anexos e mapas pretendem definir novos rumos para a ocupação da extensa região, equivalente a pelo menos cinco vezes o território de Copacabana, Ipanema e Leblon ou cerca de 10 vezes a área do Porto Maravilha.

Os profissionais familiarizados com a intrincada legislação urbanística do município terão dificuldades para compreender a aplicação da nova lei, embora seja notório que o texto contempla o grande adensamento da área, com aumento expressivo de gabaritos de altura e metragem quadrada a construir, e a conseqüente diminuição de áreas livres e permeáveis, na contramão das ações pelo desaquecimento global.

As mudanças nos bairros atingidos dependerão não apenas do poder público, mas, naturalmente, do desejo e da capacidade do mercado imobiliário que, ao eleger o lugar onde atuar, torna concretos os volumes definidos pelas normas e influencia até mesmo a mudança do perfil social dos moradores locais. Por isso, acerta o editorial ao questionar a ausência de um fórum de discussões com a participação dos diversos segmentos da população carioca.

Com a aprovação, na Câmara Municipal, do Projeto de Estruturação Urbana das “Vargens”, mais do que índices urbanísticos atrativos para os grandes empreendedores do setor imobiliário e o adensamento da região, o que está em jogo é o futuro da cidade. Abre-se mais terra para a iniciativa privada e amplia-se a demanda por recursos públicos. Afinal, a compra de mais gabaritos e áreas de construção, que a lei oferta mediante pagamento em dinheiro, não é garantida, tampouco a aplicação desses recursos – se vierem – na região. Ao mesmo tempo, o aceno se faz em detrimento de todos os outros bairros consolidados que precisam de investimentos, e pode até comprometer o projeto para a área do Porto, que também pretende atrair novos investidores.

Recentemente, o prefeito afirmou ser ele quem decide o que pode ser construído no município; uma figura de linguagem, é claro, pois o alcaide sabe que as autorizações dependem da lei em vigor. Curiosamente, neste caso, a figura é verdadeira: a decisão sobre o modelo urbanístico das Vargens está em suas mãos. A lei que produz o aumento exacerbado da malha urbana carioca poderia ser vetada e substituída conforme as reais necessidades da região. Há tempo, ainda, para evitar o que pode ser um grave equívoco, e para que o Rio encontre seu melhor caminho sob as luzes de um debate público.”

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